sagrados na Antigüidade. Tornaram-se símbolo do pecado nos
tempos medievais. Hoje, são um dos principais alvos da vaidade.
As
apostas começaram no início deste ano, na França, quando os mestres da
alta-costura apresentaram a moda do verão 93 europeu. Na passarela,
algumas manequins desfilaram com casacos leves, de corte discreto -
porém abertos, deixando o busto de fora. As griffes menos ousadas
preferiram abusar dos decotes e transparências, denunciando a ausência
do sutiã. Para certo espanto da platéia, os seios saíram do esconderijo
dos panos. E, logo ali, as pessoas passaram a questionar se a mania iria
pegar nas ruas. Afinal, o que há de mais com as mamas femininas?
Respostas não faltam. Só que essa é uma velha discussão. Pois mostrar os
seios em público é uma moda antiga, ao pé da letra. Seis séculos antes
do nascimento de Cristo, por exemplo, as mulheres gregas usavam vestes
longas, que ameaçavam cobrir os pés. Detalhe: estas se amarravam abaixo
dos peitos, que ficavam ao ar livre.
O
modelito, contudo, não era para qualquer uma. Na verdade, só as
escravas e as nobres tinham o direito de se vestir assim. No caso das
primeiras, o uniforme permitia a exibição de um de seus mais poderosos
dotes sexuais. Para as últimas, a roupa era uma forma de ostentar
status, já que o par de glândulas alimentava os filhos de sua casta.
Mais do que isso: nos trajes, as nobres tentavam se aproximar da imagem
divina, pois tanto as deusas gregas como as romanas apareciam quase
sempre de busto nu. Há quem diga que esses motivos, juntos, são a chave
do poder de sedução desses órgãos. "Toda mulher, no fundo, deseja ser
uma boa mãe e uma boa amante", opina o cirurgião Antonio de Pádua
Bertelli, do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo. "Os seios
representam os dois papéis, ao mesmo tempo."
Bertelli
opera, há mais de três décadas, pacientes de câncer de mama. Mas,
apaixonado pelo universo das artes, ele resolveu escrever, há três anos,
um trabalho sobre o significado das glândulas mamárias, ao longo da
História. Nesse sentido, os primeiros registros são do Antigo Egito,
realizados há cerca de cinco milênios. "Para aquela sociedade, os seios
eram importantíssimos", conta o médico. "Porque era o leite materno que
transmi-- tia a raça." O faraó podia ter várias esposas, mas só uma
amamentava o filho - a mãe do herdeiro. Bertelli cita, ainda, povos
primitivos africa-nos, que mantêm o caráter sagrado dos seios até ho-je:
"Em certas tribos do Sudão, em-bora as mulheres an-dem nuas, além do
marido e dos fi-lhos ninguém po-de encostar em seu bus-to. Nem sequer os
médicos. Se isso ocorre, mesmo sem querer, quem tocou os seios recebe
pena de morte".
É
sabido que, entre os mamíferos, o filhote humano é o que mais depende
do leite de sua própria espécie para sobreviver. Por isso, para
Bertelli,um dos principais atrativos dos seios é a capacidade de manter a
vida:" Não se pode esquecer que o homem é também um ser biólogico. Ou
seja, a sua dependência física, em relação às mamas da mulher, deve ser
levada em conta."
Na
Índia, por sua vez, os seios sempre foram vistos como peças eróticas.
Em um poema escrito há cerca de 4 000 anos, por exemplo, o autor,
anônimo, os descreve da seguinte maneira: "Feito frutos, alimentam os
filhos. Mas, sobretudo, saciam a fome dos homens maduros". Enquanto, nas
outras civilizações, parece que, quanto mais as pessoas notaram que os
seios atraíam o sexo oposto, mais passaram a escondê-los. Isso ocorreu
até mesmo na Grécia: depois de viverem quase quatro séculos de peito
para fora, as mulheres começaram a cobri-lo, no século II a.C.
Os
seios ficaram escondidos praticamente até o século XII desta era,
quando na italiana Veneza as mulheres resolveram relançá-los aos olhares
dos admiradores. Não eram apenas prostitutas: algumas nobres damas
também compareciam assim em banquetes. A moda pegou. Ao menos, cruzou a
Itália, no sentido Veneza a Florença. Quando chegou a esta cidade,
despertou a ira de um de seus mais ilustres escritores: Dante Alighieri
(1265-1321) desejou "as penas do in-ferno a quem mostra suas infames
tetas". Porque, na Idade Média, os seios representavam o pecado.
Raramente eram retratados nas artes - e, quando isso acontecia, estavam
sempre amamentando, isto é, cumprindo o úni-co papel aceitável para os
padrões da épo---ca. No período do Renascimento, porém, os artistas
decidiram quebrar os tabus dos tempos medievais. Um dos pioneiros foi o
pintor italiano Rafael (1483-1520), que não hesitou em fazer o retrato
da pró--pria amada com seios nus.
Talvez
influenciadas pelo exibicionismo nas artes, em toda a Europa as
mulheres passaram a usar decotes. A Igreja, claro, protestou. Uma de
suas providências foi canonizar Ágata, que teria vivido na Sicília,
Itália, no século III, quando a região era governada por Quintiliano.
Este quase enlouqueceu pela jo-vem, que recusava as suas propostas. Um
dia, inconformado, o governador ordenou que lhe arrancassem os peitos
com tenazes. Dizem que, milagrosamente, os seios voltaram a crescer
quatro dias depois do martírio. O fato é que, apesar da pressão da
Igreja, a devoção à virtuosa Santa Ágata não eliminou os decotes do
guarda-roupa. Daí, em 1683, o papa Inocêncio XI tomou uma atitude
extrema: condenou à excomunhão as mulheres que fossem à igreja sem
cobrir o colo, dos ombros ao pescoço. A proibição continou vigorando,
até há três décadas.
Neste
século, aliás, muita coisa mudou em relação aos seios. A começar pelas
medidas. Os peitos rechonchudos do passado foram substituídos pelo busto
pequeno das esguias melindrosas da década de 20. Estas, por sua vez,
cederam espaço para as divas do cinema dos anos 40 e 50: nenhuma mulher
queria ter menos peito do que Jane Mansfield ou Marilyn Monroe, por
exemplo.
Já
nos anos 60, os seios praticamente desapareceram, com a moda da mulher
magérrima. Só na década de 70, começou a imperar o meio-termo em matéria
de centímetros de busto. Hoje, de certo ponto de vista, tamanho não é
problema, já que a cirurgia plástica é capaz de moldar os seios à
vontade da freguesa. Mas ocorre um fenômeno interessante, segundo o
cirurgião plástico paulista Oswaldo Luiz Ghedini: "A maioria das
pacientes só procura a cirurgia quando realmente está precisando", diz
ele. "Há exceções, como o caso de bailarinas que, sem ter seios grandes,
querem diminuir o tamanho do busto ainda mais, para adquirir aquele
perfil de sílfide."
Para
a psicóloga Giovanna Massara de Menezes Dória, que trabalha com
pacientes de cirurgia plástica, os seios se tornam alvo fácil da
vaidade: "Eles são uma das marcas mais expostas da feminilida-de do
corpo, daí a atenção que recebem", justifica. Ela observa que as
mulheres descontentes com o visual das mamas, às vezes estão igualmente
insatisfeitas com outros aspectos de sua vida. "Existem aquelas que
convivem muito bem com seus seios por mais de quarenta anos e, chega uma
hora, com o casamento em crise, de-cidem aumentá-los ou diminuí- los",
exemplifica. Giovanna não tem nada contra a cirurgia, nes-ses ca-sos:
"Desde que a pessoa tenha cons-ciência de que essa é apenas uma maneira
de melhorar a auto-imagem e, assim, ter forças renovadas para resolver
outras questões". Quanto ao fato inegável de que os seios são ten-tações
para os homens, a psicóloga busca explicações nas primeiras fa-- ses da
infância: "Talvez, em algum canto da mente, os homens façam associações
com a satisfação experimentada, quando eram bebês".
De peito empinado
Durante
anos - toda a infância, precisamente - as glândulas mamárias mal
ultrapassam o tamanho de um feijão. É o suficiente, já que no organismo
da criança, inapto a se reproduzir, elas não correm o risco de serem
convocadas a produzir leite. Com a chegada da adolescência, porém,
aumentam no sangue da menina diversos hormônios, capazes de alterar suas
dimensões de forma drástica. "Não é um processo simples", explica o
endocrinologista Marcello Delano Bronstein, do Hospital das Clínicas de
São Paulo. "Há várias substâncias envolvidas. A protagonista, sem
dúvida, é o estrógeno, um dos hormônios sexuais femininos." Transportado
pela corrente sangüínea, ao fazer escala na região das mamas, o
estrógeno estimula a multiplicação das células glandulares e o depósito
de gordura no local.
Não
há garantias de que essas estratégias de crescimento, sozinhas,
culminem em um sutiã 40 ou 48. "O tamanho dos seios, afinal, já estava
programado pelos genes", assegura Bronstein. "Assim, nenhum tratamento
hormonal faz seios pequenos crescer." Provavelmente, a programação
genética se traduz no número de receptores espalhados nas células das
glândulas mamárias. Receptores são comparáveis a portas de entrada para
as moléculas de hormônios. "Duas mulheres podem apresentar a mesmíssima
taxa hormonal", exemplifica o médico. "No entanto, aquela com grande
quantidade de receptores exibe seios opulentos, enquanto a outra,
talvez, tenha um bus-to extremamente pequeno." Os hormônios só
influenciam as medidas do busto em ocasiões especiais. É o caso do
período menstrual, em que o estró-geno - mais uma vez - provoca a
retenção de moléculas de água na região. "Esse inchaço se repete na
gra-videz", diz Bronstein. "Mas aí, além disso, há um crescimento
temporário das glândulas mamárias, que se preparam para entrar em ação,
na tarefa de alimentar o bebê."