Templos como o da Sara Nossa Terra em Brasília lotam todos os dias. Fiéis contribuem com pelo menos 10% da renda para manter estrutura |
CORREIO BRAZILIENSE
Diego Amorim
Na Universal, um
novo templo só era autorizado se comprovassem arrecadação mínima de R$
150 mil mensais, valor reduzido para R$ 50 mil depois da forte
concorrência com outras denominações
O preconceito do
mercado com os evangélicos caiu por terra quando as cifras do mundo
gospel começaram a se multiplicar na mesma velocidade de templos e
fiéis. Com investimento maciço em comunicação, os crentes — assim
chamados, embora nem todos gostem da expressão — passaram a ser vistos e
ouvidos e, na última década, se consolidaram como o segmento religioso
que mais cresce no país, alicerçado em muita fé e muito dinheiro.
Para se
proliferarem mais rápido, igrejas neopentecostais adotaram o regime de
franquia. Na Universal, um novo templo só era autorizado se comprovassem
arrecadação mínima de R$ 150 mil mensais, valor reduzido para R$ 50 mil
depois da forte concorrência com outras denominações. Por ano,
estima-se que sejam abertas 14 mil igrejas evangélicas no Brasil. De
Bíblia na mão, oratória afinada e impulsionados pela imunidade
tributária — benefício que abrange todas as instituições religiosas —,
pastores fincam púlpitos em pequenos imóveis de esquina ou, com o dízimo
cativo (de pelo menos 10% da renda) e pago rigorosamente pelos fiéis,
erguem imensos templos luxuosos de norte à sul.
As somas
estrondosas rendem gritos de “glória” entre os mais fervorosos. O
mercado evangélico no Brasil, com 42,3 milhões de adeptos, 60% deles da
linha pentecostal, liderada pela Assembleia de Deus, faz girar cerca de
R$ 15 bilhões por ano em diversos segmentos. É o mesmo volume
movimentado pelo turismo religioso no país. A estimativa, incluindo
dados de gravadoras e editoras, é da organização do maior salão gospel
da América Latina, realizado todos os anos em São Paulo.
O segmento gospel
é o principal responsável pela sobrevida da indústria fonográfica.
Muito menos suscetíveis à pirataria e ao compartilhamento de áudios pela
internet — devido aos princípios dos fiéis —, CDs e DVDs cristãos estão
sempre entre os mais vendidos, girando algo em torno de R$ 500 milhões
anuais. Não à toa, a Sony Music criou, em 2010, um selo específico para a
música evangélica no Brasil, blindada de ventos impetuosos que
assombram o mercado tradicional.
No Brasil, igrejas católicas e evangélicas movem R$ 21,5 bilhões ao ano
“Não podeis servir a
Deus e ao dinheiro”
Lc 16, 13
“Porque a raiz de todos os
males é o amor ao dinheiro”
I Tom 6,10
A
relação das religiões cristãs com o dinheiro, ao menos abertamente,
nunca se deu de maneira confortável. Antes de a chamada teologia da
prosperidade apresentar aos fiéis a ideia de que graça divina e riqueza
são diretamente proporcionais, o tema só aparecia nos sermões se fosse
para ser abominado. Os primeiros padres definiam o dinheiro, ainda nos
idos dos anos 200, como “excremento do diabo”, sempre associado à
vaidade e ao orgulho, pecados mortais capitais.
O
fato de os assuntos financeiros figurarem na lista dos mais sensíveis
para os líderes de igrejas, porém, não impediu que, ao longo da
história, as religiões cristãs acumulassem um patrimônio bilionário.
Mesmo com tanto tabu em torno das sagradas finanças, padres, bispos e
pastores precisaram aprender a contar dinheiro e a se convencer de que,
sem ele, a manutenção dos templos, a caridade e a própria missão de
evangelizar ficariam impossibilitadas.
A
partir de hoje, o Correio destrincha a economia movimentada pela fé no
Brasil, revelando como instituições religiosas, favorecidas pela
imunidade tributária, administram o constante volume de ofertas, dízimos
e recursos de outras naturezas. Por dia, as igrejas do país — a maioria
católicas e evangélicas — arrecadam, em média, quase R$ 60 milhões.
Somente em 2012, segundo dados exclusivos levantados pela Receita
Federal, R$ 21,5 bilhões entraram nos cofres divinos. Em relação ao ano
anterior, o recolhimento cresceu 4,3%, salto considerável diante do
tamanho do montante.
Quadros
desfavoráveis ou mesmo crises econômicas não costumam atingir a receita
das igrejas. As doações respondem por 72% do dinheiro em caixa. O
restante equivale a rendimentos gerados com aluguel ou vendas de bens,
aplicações em renda fixa ou, em casos mais raros, operações na Bolsa de
Valores.
Em
geral, as igrejas têm aversão ao risco e, por isso, optam por políticas
de investimento bastante conservadoras, não priorizando a
rentabilidade. A sobra dos recursos doados às instituições, na maioria
das vezes, cai na poupança ou é aplicada em Certificado de Depósito
Bancário (CDB), os dois modelos mais simples de fazer o dinheiro render.
Estratégias ousadas, como a compra e a venda de ações, normalmente são
feitas em nome dos próprios líderes.