A
loucura, entre os séculos XII e XII, recebeu status de alienação
mental, dessa forma acabou sendo considerada uma “doença mental”. A
partir dessa concepção as práticas psiquiátricas tornaram-se
dispositivos alienantes sobre a loucura. Todas estratégias de
intervenção, como o internamento e o isolamento, acabaram por produzir a
própria alienação mental. A loucura era considerada uma característica
de estar “fora-de-si”.
O
internamento era justificado como uma forma de isolar o louco da
sociedade, afim de protegê-la da periculosidade que ele representava, já
que a doença mental era comparada à criminalidade. Existia uma grande
segregação, uma espécie de higienização social. Afirmavam que a
internação era para o bem do louco, quando na verdade eram as pessoas
que o temiam e queriam manter distância.
Nunca houve
uma clara definição da loucura no passado, dessa forma os considerados
loucos eram alocados em asilos ou prisões junto de outros indivíduos,
como doentes da lepra, indigentes, criminosos. A cura psiquiátrica
caracterizava-se como um tratamento moral.
No século
XIII, a medicina social foi definida por medidas de quarentena e
mecanismos de exclusão. A psiquiatria se desenvolveu nesses mesmos
axiomas e a loucura viu-se aprisionada dentro desta lógica. O trabalho
da psiquiatria visava uma higienização pública antes mesmo de funcionar
como campo de produção de conhecimento.
Todo o saber
sobre a loucura dessa época foi regido pela psiquiatria. O sujeito
doente sequer podia responder por suas responsabilidades. Ao invés de
ajudar, as práticas psiquiátricas contribuíam para a patologização do
sujeito. O fato de o psiquiatra possuir autoridade inquestionável já
funcionava como um dispositivo de alienação. As práticas de cuidados com
os loucos não visavam uma cura de maneira romântica, mas sim a
solidificação do poder do psiquiatra sobre aqueles que estavam em
sofrimento psíquico.
A visão atual
Hoje, há um
grande esforço para a extinção de instituições como manicômios e
instituições de reclusão. A ideia atual é a de substituir esse tipo de
instituição por serviços que não visam o internamento, como como os
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) e os Núcleo de Apoio Psicossocial
(NAPS), que trabalham de maneira mais humanizada, com um olhar focado
não apenas na doença, mas sim no sujeito como um todo. Uma visão
biopsicossocial.
Observamos
no século XXI uma banalização em relação ao uso de psicofármacos para o
tratamento de desconfortos emocionais ou angústias. A psicopatologia na
contemporaneidade ganhou classificações a partir de manuais, tais como
os DSMs (Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais) e
CID-10 (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas
Relacionados à Saúde). Os diagnósticos de depressão e síndrome do pânico
tornaram-se algo comum. O uso de medicamentos é de extrema importância
em casos de psicoses com surtos frequentes, ou de depressão severa,
porém o uso indiscriminado acaba por rotular e alienar o paciente. A
busca por resultados imediatistas acaba por fazer a pessoa se
medicamentar quando sentir qualquer tipo de desconforto, por mais leve
que seja. Psicofármacos possuem alto grau de dependência, é preciso
cuidado no manejo desse tipo de medicamento.
É necessário
ter certo cuidado em relação a diagnóstico, que hoje funciona como um
dispositivo alienador, pois ao receber determinado “rótulo”, a pessoa o
internaliza, transformando-se realmente naquilo que esse rótulo diz. O
sofrimento mental é visto como algo exterior, uma doença, como um vírus.
Entretanto, para compreender o sujeito e sua atual condição, é
necessário todo um cuidado e um olhar que vão além da doença.
Dizem que
estamos vivendo a pós-modernidade e seu discurso impõe um ritmo
acelerado, imediatista, que não garante ao sujeito o direito de
vivenciar suas angústias e tristezas, a pessoa não tem tempo para o
processo de melhora, ela precisa estar boa já, de imediato. Há uma forma
considerada ideal e aceitável de viver, existem padrões impostos, além
de uma estimulação para o consumo desenfreado. Tudo isso propicia formas
de subjetivação que sugerem depressão ou angústia. É aí onde entra o
uso indiscriminado de medicamentos, funcionando como uma maneira de
camuflar todo comportamento não aceitável socialmente e sofrimento
interiorizado.
Alan Martins