As 200 meninas sequestradas na Nigéria chegam a ser violentadas mais de uma dezena de vezes por dia.

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As notícias que chegam da Nigéria são ainda mais alarmantes, se é que podemos falar nesses termos depois de tudo que já aconteceu até aqui. Agora um grupo de oito meninas com idade entre 12 e 15 anos foi sequestrado e o ataque de abril continua sem solução. Desde 2009, aproximadamente 2000 pessoas já foram mortas e mais de uma centena de escolas já foi fechada na região de Borno pelo grupo de extremistas Boko Haram. O principal objetivo dos terroristas é instaurar uma estado islâmico com graves implicações para as mulheres, com apoio inclusive de alguns intelectuais cuja percepção é de que a educação ocidental corrompe o país.

O fato de tantas escolas estarem com as portas fechadas se torna ainda mais temeroso pois o número de meninas fora delas tem crescido numa tendência oposta à da África subsaariana. A taxa de analfabetismo é de aproximadamente 35% entre as jovens de 15 a 24 anos, enquanto é de 25% entre homens da mesma faixa etária. Considerando o universo das mulheres adultas, contadas a partir dos 15 anos, esse número é em torno de 50%. Quase 40% delas não recebe cuidados durante a gravidez e sua expectativa de vida é de apenas 52 anos, por exemplo. As estatísticas mais otimistas dão conta que 70% da população vive com menos de um dólar por dia.
A fragilidade da mulher nigeriana é tamanha que eté mesmo aquelas que estão lutando pela libertação das meninas estão em perigo como Naomi Mutah Nyadar, uma das líderes dos protestos exigindo que a leniência das autoridades para com o caso acabe. O governo cinicamente declarou que a ativista não foi presa mas que teria sido convidada a prestar esclarecimentos. Como os protestos podem ser vistos da prédio onde acontece até o dia 09 de maio o Fórum Econômico Mundial, o objetivo é silenciar as manifestações. Ainda mais agora que a mobilização para que as vítimas sejam encontradas ganhou notoriedade com a hashtag #BringBackOurGirls, hoje com mais de um milhão de impressões e publicada no twitter no dia 26 de abril por ativistas e com uma página homônima no facebook.
O governo chegou a alegar que pouco foi feito até o momento porque os familiares não teriam fornecido informações o bastante e o presidente nigeriano Goddluck Jonathan disse que estão fazendo muito mas não estão falando sobre isso. “Nós não somos Americanos. Não estamos nos exibindo para as pessoas sabe, mas isso não significa que não estamos fazendo nada”. Agora, diante da atenção da comunidade internacional para o descaso, estão oferecendo uma recompensa de 669 mil dólares para quem tiver informações além de aceitar a ajuda norte-americana para encontrar as vítimas.
O tempo é precioso. As jovens sequestradas são submetidas a casamentos e conversão forçadas, além de serem estupradas para que permaneçam obedientes aos seus “novos mestres”. Foi reportado que algumas chegam a ser violentadas mais de uma dezena de vezes por dia. Aquelas que se recusam a cooperar, são sumariamente mortas à facadas. Algumas são obrigadas a presenciar assassinatos, como se estivessem sendo treinadas a se acostumar. Os relatos nos falam de uma dor indizível causada por uma combinação hedionda entre machismo, terrorismo e fanatismo religioso. A dor de cada mulher atingida é de todas nós, especialmente das mulheres negras da diáspora. A Nigéria chora e nós com ela.
Entre as 230 meninas sequestradas no dia 14 de abril, 43 conseguiram fugir. “Eu amararia que todos nós pudéssemos escapar. Eu não posso celebrar minha fuga porque alguns dos meus amigos e colegas da escola ainda estão nas mãos dos insurgentes e eu não sei o que eles estão passando. Eu rezo pra que eles possam ser liberados”, continuou Amina Sawok. Para Thabita Walse, o sentimento é o mesmo. “Eu não tenho problemas, eu estou bem e muito forte psicologicamente. O único problema que eu tenho são que tenho é que alguns dos meus amigos ainda estão nas mãos dos terroristas”.
A conversão religiosa imposta tornaria essas mulheres espiritualmente “viáveis” para que possam ser casadas à força. “Eles me perguntaram se eu era cristã ou muçulmana. Eu disse que era Cristã. (…) Eles trouxeram um homem até a mim e disseram que ele gostava de mim e que eu deveria me converter ao islamismo para assim poder me casar”, reportou uma jovem de 23 anos que conseguiu fugir do cativeiro em março desse ano. “Eles continuam cortando a garganta das pessoas com facas”. Aqueles que tentaram escapar foram baleados, mas dificilmente eles usam suas armas pra matar. Eles geralmente usam facas. Cerca de 50 pessoas foram mortas na minha frente”, continuou.
Abukabar Shekau declarou que pretende vender as jovens sequestradas em abril, em mais uma demostração de qual seria o papel das mulheres no estado islâmico que pretendem organizar. É possível que nesse momento as vítimas não mais estejam em território nigeriano, vendidas como escravas. Esse não é um golpe dado ao acaso, atacar a mulher é parte crucial de uma perversa estratégia econômica, psicológica e financeira adotada pelo Boko Haram. Estamos falando numa modalidade de terrorismo baseado no gênero, um crime contra a humanidade que deve ser denunciado e combatido pela comunidade feminista e por cada uma de nós que somos submetidas às mesmas violências ao redor do mundo, em especial nós mulheres negras.
Somos indivíduos com direito a termos direito. Com acesso obrigatório à educação de qualidade e sem censura ideológica, com liberdade para escolher nosso futuro acadêmico . Com plenos poderes de decisão sobre nossos corpos, escolhendo se queremos ter relações sexuais e com quem. Se queremos ter filhos. Se não queremos ter filhos também. Nenhuma de nós deve ser estuprada, obrigada a se casar ou a se converter a uma fé que não professa. Temos o direito de não termos fé inclusive. Temos o direito de ir e vir, como bem nos aprouver. Nenhuma de nós deve ser escravizada, jamais. E se uma de nós é privada de seus direitos, todas somos. Como disse Sawok, a liberdade ainda é incompleta. Lá e aqui.
Fonte:Pragmatismo Politico

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