Entre
30% e 50% dos brasileiros portadores de transtorno bipolar tentam
suicídio. Essa é a estimativa sustentada pela ABTB (Associação
Brasileira de Transtorno Bipolar). De acordo com a entidade, dos que
tentam se matar, 20% conseguem o objetivo. “De todas as doenças e de
todos os transtornos, o bipolar é o que mais causa suicídios”, alerta a
presidenta da ABTB, Ângela Scippa.
Segundo a professora de psiquiatria
Maria das Graças de Oliveira, da UnB (Universidade de Brasília), existe
um risco real de suicídio principalmente nos estados mistos, em que os
sintomas de depressão com o de exaltação do humor se misturam.
“É importante dizer que um dos maiores
inimigos do paciente é o preconceito”, ressaltou a professora. Ela
acrescentou que não é raro verificar pessoas que sofrem com o transtorno
evitarem o tratamento porque tem preconceito contra o acompanhamento
psiquiátrico e os medicamentos de controle da doença. “Essas pessoas
precisam
O professor de educação física Fernando
Carvalho, diagnosticado há 11 com a doença, conta que já chegou a pensar
em suicídio. “Tem horas em que a gente se pergunta se tomou uma certa
decisão porque estava em um momento de crise ou se foi uma decisão
racional. Quando você deixa de acreditar em si mesmo dá vontade de
terminar com tudo”, relatou.
O controle do transtorno bipolar é feito
com estabilizadores de humor e complementado com terapia
comportamental. “Quando a pessoa inicia o tratamento, fica mais atenta
ao seu próprio comportamento e aprende a controlar os sintomas. Não
existe a cura, mas existe o controle. Com o tratamento à base de
medicamentos, o paciente não desenvolve mais os sintomas e assim pode
ter uma vida tranquila e controlada”, explicou Ângela.
“O tratamento me deu discernimento para
saber quando eu estou mudando de humor. Quando eu tenho uma crise de
depressão eu ainda fico muito agressivo, mas eu consigo direcionar a
raiva e preservar as pessoas de quem gosto” disse Fernando. Ele
acrescentou que “nas situações de crise machucava as pessoas, perdia
amigos e namorada. É muito difícil viver nesse conflito”.
Fernando lembrou de uma ocasião em que
decidiu suspender o tratamento porque se sentia bem e menos de seis
meses depois teve uma crise, na qual expulsou toda a família da sua casa
na noite de réveillon. “Meu padrasto nunca mais falou comigo, mesmo
depois de pedidos de desculpa. Não dá para deixar o tratamento, as
consequências podem ser permanentes”, lamenta.
A tendência do paciente com transtorno
bipolar sem tratamento é ter crises cada vez mais intensas, e com
intervalos menores. Maria das Graças alerta que o humor patologicamente
alterado refletirá na instabilidade de comportamento, o que se manifesta
na vida profissional, social, familiar e acadêmica.
O tratamento na maioria das vezes leva a
uma remissão dos sintomas da crise, ou seja, tira o paciente da
depressão, da mania ou da hipomania. “Uma vez que saiu da crise, a cada
100 pacientes que interrompem o tratamento, 47 voltam a ter uma nova
crise em menos de um ano, e 92 em até dois anos. Como a taxa é muito
alta, existe um consenso internacional de que o paciente tem que fazer
um tratamento profilático, preventivo, para evitar futuros episódios”,
explicou a psiquiatra.
Ela conta que os tratamentos
profiláticos diminuem pela metade a chance de novas crises, mas alerta
que as pessoas portadoras de transtorno bipolar são muito sensíveis a
estressores psicossociais. “A pessoa pode estar bem, e, se morre um ente
querido, isso gera um estresse significativo e ela entra em uma nova
crise. O medicamento sozinho não consegue resolver o problema.”
Depois de se separar do marido, com quem
foi casada por seis anos, a técnica de enfermagem Elizabete Couto,
descobriu que ele tinha transtorno bipolar. “Ele teve todo tipo de
problema relacionado ao transtorno bipolar, se envolveu com bebida,
drogas, fazia barbaridades e depois pedia perdão chorando” relembra.
Ela conta que, depois da separação, o
ex-marido foi diagnosticado como portador da doença. “Quando ele foi
diagnosticado, nós voltamos, na condição de ele se internar para começar
o tratamento. Hoje, ele ainda tem momentos depressivos, muito
relacionados a eventos do dia a dia, mas mudou muito se comparado a [às
reações que tinha] antes do tratamento”, relatou Elizabete.
A técnica de enfermagem ainda contou
que, antes do tratamento, foi agredida pelo marido. “Ele era totalmente
perturbado, ouvia vozes, arrumava antipatia com todo mundo, era
agressivo, me agredia, arrumava confusão com as pessoas da rua,
vizinhos, sempre ficava comigo a parte de resolver os problemas da
família e limpar a barra dele”.
Fonte: Agência Brasil.