Constatar o óbvio

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Teodora Cardoso, presidente do Conselho de Finanças Públicas, constata o óbvio: a escolha entre investimento, i.e., bens de capital, e consumo, i.e., bens de consumo, é uma escolha que pressupõe preterir de um bem em privilégio de outro. E reforça o ainda mais óbvio: consumo não é criação de riqueza, é distribuição e posterior destruição de riqueza, pois os bens deixam de estar disponíveis, embora este seja o objectivo ulterior de qualquer sociedade: vivemos para consumir, não para produzir, mas para podermos consumir temos de produzir, daí o adágio de Say.


Este problema económico não é exclusivo da dualidade investimento vs consumo, é extensível a todos os problemas que lidem com recursos escassos, em que escolhas têm de ser feitas. Às combinações possíveis que maximizam o output dá-se o nome de Fronteira de Possibilidades de Produção.

Para um determinado nível de tecnologia, o país tem de escolher entre consumir e investir (ou entre produzir laranjas ou pêssegos, ou entre aumentar despesa saúde ou despesa educação, etc.). Para consumir mais os agentes têm de abdicar de investimento, pois diminui o rendimento disponível, e vice-versa. Ora, só existem três formas de mitigar este problema, sendo que apenas duas delas são sérias: 1) aumentar o nível de tecnologia, o que geralmente requer mais investimento, o que poderá implicar abdicar de algum consumo no presente, para que seja possível consumir mais no futuro (ineficiência dinâmica); 2) aumentar o endividamento externo 3) ignorar o problema e gritar que as pessoas não são números e vidas não se medem assim.
Tendo em conta que o endividamento externo de Portugal chega agora aos 234% do PIB, resta apenas a primeira opção, perceber que maior investimento acarreta menor consumo. Ora, dado que as famílias e empresas são livres de decidir sobre a sua própria afectação de recursos, a mensagem de Teodora Cardoso é necessariamente para o Estado. Se o investimento público está em cima da mesa, há que encontrar as rúbricas em que cortar para compensar esse aumento; e se mais ajustes fiscais estão a ser considerados, então os impostos sobre o capital e sobre o trabalho deverão baixar — impostos que criam as maiores distorções ao crescimento económico —, e compensados com aumentos dos impostos sobre o consumo ou, idealmente, com reduções efectivas da despesa estrutural, aumentando assim o rendimento disponível dos agentes económicos capazes de investir.
Isto é constatar o óbvio, mas tendo em conta que o óbvio está longe de ter sido compreendido, constatar não basta. Torna-se necessário repeti-lo ad nauseum.

http://oinsurgente.org/

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