Venezuela à beira da falência

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Imagem: Jorge Silva / Reuters
A fila de consumidores na porta dos supermercados tornou-se paisagem cotidiana na Venezuela e símbolo mais concreto de sua falência econômica. Dono da maior reserva de petróleo do mundo e beneficiado pelo preço internacional de US$ 99 por barril, o país convive com três taxas oficiais de câmbio e a escassez de produtos básicos, entre os quais o papel higiênico. Em meio aos protestos contra o governo, a população encara a depressão econômica, a inflação recorde na América Latina e o desmonte da Petróleos de Venezuela (PDVSA).


"Nenhum país da região, nem mesmo a Argentina, vive tamanha disfunção econômica", resume o economista Orlando Ochoa, que coordenou um relatório com outros 46 colegas, em janeiro. O texto concluiu que o governo embarcou em um "círculo vicioso de práticas incapazes de prover estabilidade econômica à Venezuela".
A fatura desse quadro cai na escrivaninha de Maduro, presidente eleito em 2013 para suceder seu "pai político", Hugo Chávez. A oposição e, cada vez mais, os setores populares têm exigido mudanças na área econômica. A resposta do governo aos protestos nas ruas tem sido a repressão.
Durante a primeira rodada de diálogo entre governo e oposição, em março, o presidente da PDVSA e czar da Economia, Rafael Ramírez, declarou ser um "sucesso" a política de distribuição dos lucros da estatal, que teria reduzido em 30% a pobreza no país.
Ramírez foi confrontado pela oposição ao fato de a inflação venezuelana ter alcançado 57,6% ao ano, em fevereiro. Deve fechar o ano em 75%. O Produto Interno Bruto (PIB) vai encolher 0,5%. A escassez de produtos básicos está em 28% e o custo da cesta básica aumentou 71,6% em apenas um ano. "Meu dinheiro não dá para as despesas. Tenho de buscar produtos de mercado em mercado e pagar mais caro. Nunca vi a situação tão grave como agora", afirmou a professora universitária aposentada Dorcy Rodríguez, de 69 anos.
Arlen Valero, de 35 anos, é dona de um micromercado na favela 23 de Janeiro, o maior complexo chavista de Caracas. Há mais de um ano, não tem nas prateleiras os itens de maior procura - farinha de milho, açúcar, papel higiênico, café, óleo e leite. O movimento é garantido pelos itens menos demandados e pelo fato de o mercadinho funcionar como caixa automático do Banco de Venezuela. O limite de saques é dado pelo seu próprio caixa. "Tenho de ir às filas do supermercado para comprar farinha de milho."
A carência de produtos foi gerada, em parte, pela incerteza das estatizações, pelo congelamento de preços e a limitação legal ao lucro no governo Chávez. Muitas empresas fecharam as portas, como a da área de energia onde Charbel Roye trabalhava. "Vivo agora de comprar e vender bens. Não há emprego." O próprio Maduro admitiu na semana passada haver apenas 3 mil empresas nacionais no país, das quais 600 paralisadas.
Mas esse quadro e todos os demais indicadores negativos estão vinculados ao drama da PDVSA e à dependência do petróleo. A exportação petroleira responde por 96,3% do total embarcado - nível mais alto desde 1950. Segundo o economista José Toro Hardy, em 1998 a estatal projetava produção de 5,5 milhões de barris ao dia até 2003. Esse nível nunca foi alcançado. Segundo o governo, são 2,8 milhões diários. O relatório organizado por Ochoa diz ser menos, 2,6 milhões de barris ao dia.

Nos últimos 15 anos, o número de funcionários saltou de 20 mil para 110 mil, e a estatal tornou-se dona das redes de supermercados populares Pdval e Mercal. "O principal negócio da PDVSA deixou de ser o petróleo. A eficiência caiu e sua dívida total é estimada hoje em US$ 120 bilhões", afirmou Hardy.
No ano passado, a exportação foi 6,4% menor do que em 2012. A redução do volume de dólares provocou uma situação bizarra: o país convive com quatro taxas de câmbio, das quais três oficiais. A terceira delas, Sicad 2, foi adotada em março para permitir a flutuação da moeda e desafogar o mercado paralelo. Mas não há dólares suficientes. Sua cotação gira em torno de 51 bolívares por dólar, enquanto a do paralelo chega a 70 bolívares.
Os produtos básicos, que entram no país pela cotação oficial de 6,30 bolívares por dólar, acabam contrabandeados para a Colômbia e outros vizinhos pela taxa paralela. Hospitais e farmácias sofrem o mesmo dilema. As montadoras Toyota, Ford e General Motors suspenderam suas atividades por falta de dólares para a importação de partes e peças. As concessionárias estão fechadas.
Assim como há menos dólares gerados pela PDVSA, há menos imposto pago. A dívida pública consolidada saltou de US$ 32 bilhões, em 1998, para US$ 204 bilhões, em 2013. A redução desse passivo não está no horizonte. Ainda assim, a gasolina continua subsidiada e custa R$ 0,01 por litro.
Denise Chrispim Marin 
O Estado de S. Paulo
Editado por Folha Política

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