O Banco do Brasil gastou R$ 5 milhões em ingressos Imagem: Divulgação |
Um grupo de
milionários, empresários e parceiros "estratégicos" vai assistir os
jogos da Copa do Mundo sem pagar nada, com ingressos pagos por bancos e
outros órgãos públicos ou de economia mista.
No total, a
Folha de S. Paulo mapeou compras de R$ 9,1 milhões em ingressos. As
compras foram acertadas com a operadora da Fifa desde 2012 — bem antes
da liberação deste último e concorrido lote de ingressos.
A maior fatia,
R$ 5 milhões, foi paga pelo Banco do Brasil, empresa de economia mista
que tem o governo federal como principal acionista. O BB não revela
quantos ingressos comprou, nem para quais jogos.
Os ingressos
serão distribuídos a clientes escolhidos a dedo pelo banco. A prioridade
do BB é o segmento "ultra high", para clientes com investimentos acima
dos R$ 50 milhões. Representantes de grandes empresas também foram
agraciados pelo banco.
A Caixa
Econômica, por outro lado, abriu os cofres para agradar seu público
interno. No total, serão 480 ingressos, para 14 partidas, a R$ 1,8
milhão. A campanha "Bateu é Gol", destinada aos donos das lotéricas,
distribuiu 320 ingressos, a R$ 1,5 milhão.
O resto foi
para a campanha de incentivo "Vai Brasil", destinados aos empregados do
banco. O melhor jogo pago pela Caixa é da fase de quartas de final. Em
Brasília, o BRB, banco cujo acionista majoritário é o governo do
Distrito Federal, gastou R$ 1,2 milhão em 30 ingressos para clientes
para cada um dos sete jogos na capital.
Na arena de
Recife, uma empresa do governo de Pernambuco garantiu com a Fifa um
camarote para os cinco jogos que acontecerão no local. A compra foi
feita pela administração do Porto de Suape, que selecionará executivos
de empresas "estratégicas" para irem aos jogos e, também, visitarem o
complexo.
O camarote tem
18 lugares — dois representantes do porto vão ciceronear os empresários.
A ideia é, a cada jogo, mudar o grupo de convidados. A ação custará R$
745 mil.
No Rio, o
Brasil Resseguros comprou R$ 411 mil, para jogos na capital fluminense. A
compra foi feita em março. Em outubro, foi finalizado o processo de
privatização da estatal — entre os principais acionistas está o Banco do
Brasil.
A Folha
questionou esses órgãos se entre os recebedores de ingressos havia
políticos. Banco do Brasil, BRB, Caixa e o Porto de Suape negaram. O
Brasil Resseguros informou que os ingressos irão para "clientes
selecionados em função de parcerias negociais".
RECOMENDAÇÃO
Nos últimos
meses, promotorias de diversos Estados recomendaram aos governos locais
que não usem dinheiro público para comprar ingressos. Em Brasília, por
exemplo, a promotoria do DF afirma que a compra pode se enquadrar em
"irregularidade e desvio de finalidade na despesa pública, pois o gasto
não almeja o atendimento do interesse público".
O Ministério
Público do DF avalia se o caso do BRB, por ser um banco, se enquadra na
recomendação. O banco respondeu aos questionamentos da promotoria, que
analisa a documentação. O governo de Pernambuco também recebeu
recomendação similar.
Em 2013, apesar
de questionado pelo MP do DF, foram adquiridos ingressos e camarotes no
valor de quase R$ 3 milhões por outra estatal do governo distrital. A
compra foi parar na Justiça.
OUTRO LADO
Os bancos
públicos e órgãos que compraram ingressos para a Copa do Mundo defendem a
prática. Segundo o Banco do Brasil, estratégia semelhante é adotada
pelos concorrentes de mercado. "O Banco do Brasil adquiriu ingressos
para convidar os melhores clientes do segmento de alta renda e
representantes de grandes empresas, como parte de sua estratégia de
marketing".
A justificativa
do BRB vai na mesma linha do Banco do Brasil. O banco disse ainda que a
compra foi feita antes da recomendação do Ministério Público.
"O BRB
esclarece que se trata de uma ação estratégica de negócio e
mercadológica, comum no segmento de varejo bancário, e que visa a
consolidação da marca na cidade, perante seus clientes e a população",
disse.
A Caixa, por
sua vez, disse que a compra serviu como incentivo para os funcionários e
donos de lotéricas que bateram metas. A administração do Porto de Suape
disse que o complexo serve como "âncora" para investimentos em
Pernambuco.
"O camarote é
exclusivo para que representantes de Suape recepcionem executivos de
empresas consideradas estratégicas para Pernambuco, para o adensamento
e/ou estímulo de cadeias produtivas".
A administração
de Suape esclarece, ainda, que a compra foi feita antes da recomendação
do Ministério Público, dentro da legislação, e que tem receita própria,
sem depender de repasses do governo. O Brasil Resseguros informou que a
"aquisição de ingressos para competições esportivas é uma das ações de
relacionamento voltada, exclusivamente, para clientes selecionados em
função de parcerias negociais".
Filipe Coutinho
Folha de S. Paulo
Editado por Folha Política