Pesquisas sugerem que o cúrcuma, ingrediente do curry, pode ajudar no tratamento de doenças como o câncer, a artrite reumatoide e o mal de Alzheimer
O indiano Bharat Aggarwal, de 57 anos, toma uma cápsula
de 500 miligramas de curcumina há três anos todas as manhãs. A
curcumina é um dos componentes do cúrcuma, ingrediente que dá a cor
amarelada ao curry indiano, um tempero à base de várias especiarias. O
que interessa a Aggarwal não são as qualidades gustativas do condimento,
que chamaram a atenção do italiano Marco Polo em sua viagem ao Oriente,
no século XIII. Para ele importam outras propriedades. A curcumina,
presente no tempero de gosto
levemente amargo, seria um poderoso anti-inflamatório, antioxidante e
antimicrobiano. "Não lembro da última vez em que tive um resfriado",
disse Aggarwal. "Se é a curcumina, eu não sei. O que importa é que
continue funcionando."
Aggarwal
não é exatamente um hipocondríaco nem um fanático por remédios da moda.
É pesquisador do Departamento de Terapias Experimentais do M.D.
Anderson Cancer Center, instituição ligada à Universidade do Texas e uma
das referências da pesquisa de câncer nos Estados
Unidos. Há quase 20 anos, o cientista indiano, que vive desde a década
de 70 nos Estados Unidos, recorreu à cultura de seu país de origem para
procurar novos tratamentos para o câncer. "O uso do cúrcuma tanto na
alimentação quanto como fitoterápico é documentado na literatura indiana
há mais de 2 mil anos", diz o clínico-geral Aderson Moreira da Rocha,
presidente da Associação Brasileira de Ayurveda, a tradicional medicina
indiana. Lá, a planta é usada principalmente para tratar ferimentos e doenças de pele.
Mas o que vem chamando a atenção da medicina ocidental para a planta é o
potencial de seu principal componente, a curcumina, para tratar doenças
graves, como câncer, mal de Alzheimer e fibrose cística.
A
ação da curcumina sobre o câncer é uma das áreas que mais têm recebido
atenção dos pesquisadores. Nos Estados Unidos, por exemplo, o Instituto
Nacional de Câncer registra atualmente 14 pesquisas em andamento ou cujo
início já foi aprovado. No Brasil, o resultado de um estudo realizado
pela Universidade Federal de Goiás foi apresentado em fevereiro. A
bióloga Marcella Lemos Brettas Carneiro aplicou curcumina em células de
melanoma humano, o tipo mais grave de câncer de pele, cultivadas em
laboratório. Quase 90% das células que receberam altas concentrações de
curcumina morreram. A próxima etapa é testar o procedimento em
pacientes, o que deve ocorrer no segundo semestre. "Uma das vantagens da
curcumina é que ela faz com que a célula cancerosa diminua até ser
absorvida pelo organismo", diz Lidia Andreu Guillo, orientadora do
estudo. Outros tipos de drogas usadas no tratamento de câncer seriam
mais agressivos a nosso organismo. Elas fazem com que a célula doente
arrebente, acionando o sistema de defesa do corpo, que gera uma
inflamação na região. A curcumina é considerada um tratamento promissor
por ser barata e não tóxica ao organismo.
Com as pesquisas, os cientistas estão conseguindo desvendar o mecanismo de ação da curcumina sobre o câncer. A doença
se caracteriza pelo crescimento desordenado de algumas células em nosso
corpo. E a curcumina atua sobre várias proteínas que regulam tanto a
proliferação quanto a morte das células. Por isso, teria efeito sobre o
câncer. "Essa ação múltipla é maravilhosa. Mas, ao mesmo tempo, pode ser
uma desvantagem", afirma Marcella. Não se sabe como controlar a ação da
substância. Os pesquisadores ainda não conseguem determinar até que
ponto a curcumina vai inibir as proteínas que causam o crescimento da
célula cancerosa (o que é bom) ou inibir as proteínas que matariam as
células doentes (o que é ruim). Esse tipo de efeito adverso foi revelado
por três estudos, feitos por pesquisadores americanos e israelenses em
células de leucemia mielóide, câncer de cólon e câncer de mama. Apesar
dessas pesquisas, Aggarwal, do M.D. Anderson Cancer Center, acredita que
as evidências positivas do cúrcuma prevalecem. "Há quase 2 mil artigos
sobre os benefícios da curcumina e apenas três mostrando que talvez ela
faça o contrário", afirma.
Outro
problema é que a maioria dos estudos sobre o assunto foi feita com
animais ou com células cultivadas em laboratório. Ainda é necessário
testar amplamente a ação da curcumina em pacientes para saber como ela
interage com outros medicamentos. Os testes clínicos, além de provar ou
não sua eficácia, mostrarão se a curcumina interfere nas outras drogas e
quais são os efeitos. Já existem tratamentos patenteados para alguns
tipos de câncer que combinam a ação da curcumina com radioterapia ou
quimioterapia. Na opinião do oncologista Antonio Carlos Buzaid, diretor
do Centro de Oncologia do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo, ainda é
cedo para combinar o uso da curcumina com outras drogas. Ele receita
experimentalmente a curcumina apenas para pacientes que já esgotaram os
tratamentos convencionais. Dos sete que ingeriram 8 gramas de curcumina
por dia, apenas um teve uma boa resposta: apresentou redução de 30% no
câncer durante oito meses. "A curcumina é barata e não é tóxica ao
organismo nessas dosagens, por isso pode ser usada experimentalmente",
afirma Buzaid. "Mas é preciso lembrar que não existe uma solução
milagrosa."
Ainda
é necessário cautela para usar a curcumina em doenças graves. Mas, se
você está se perguntando se aquele arroz com curry do restaurante
tailandês ou indiano terá algum efeito sobre sua saúde, a resposta é
animadora. As pequenas doses de curcumina ingeridas por meio da
alimentação não seriam suficientes para tratar um câncer, mas poderiam
ajudar na prevenção de doenças. Embora esse tipo de estudo ainda precise
ser aprofundado, Aggarwal acredita que uma evidência esteja na relação
entre a incidência de câncer na população da Índia e o uso abundante de
cúrcuma no país. "Nós sabemos que o cúrcuma pode diminuir o câncer,
então há uma razão para explicar que a incidência de câncer de pulmão,
de cólon, de mama e de próstata seja menor na Índia que nos Estados
Unidos", diz. Segundo a Organização Mundial da Saúde, o câncer é
responsável por 31,7% das mortes nos EUA e 9,5% na Índia. A alimentação
dos indianos, rica em curry, pode explicar a incidência menor da doença
no país. Mas, embora estilo de vida seja um fator importante no
desenvolvimento de câncer, não se pode esquecer que nos Estados Unidos
as pessoas vivem mais. Como há mais idosos, a incidência de câncer
tenderia a aumentar.
Quem
quiser aproveitar as propriedades medicinais do cúrcuma e dar um sabor e
uma cor a mais à comida pode seguir a sugestão do chef David Zisman, do
restaurante tailandês Nam Thai, em São Paulo. "Ele vai bem em
preparados com leite de coco, no arroz e em peixes, frangos e vegetais
refogados."
TRATAMENTO PICANTE
Como a curcumina, um componente do cúrcuma, pode tratar doenças
• Câncer
Estudos
do M.D. Anderson Cancer Center, nos EUA, mostraram que a curcumina
inibiu proteínas associadas ao desenvolvimento de câncer de cólon, pele
(melanoma), próstata e mama.
• Artrite reumatoide
A
curcumina impediu a inflamação das articulações características da
doença, em um estudo conduzido por pesquisadores da Universidade do
Arizona, nos Estados Unidos
• Mal de Alzheimer
Um
estudo realizado pela Universidade da Califórnia, nos EUA, sugere que a
curcumina pode ajudar a eliminar as estruturas associadas ao mal de
Alzheimer no cérebro
• Cirrose hepática
Cientistas
americanos, chineses e finlandeses constataram, em um estudo com ratos,
que a curcumina bloqueou a ação de uma proteína ligada à cirrose
hepática
• Fibrose cística
Uma
pesquisa com ratos na Universidade Yale, nos EUA, revelou que a
curcumina pode compensar o defeito genético causador da doença, que
afeta vias respiratórias, pâncreas e fígado
Fonte: Revista Época
http://curapelanatureza.blogspot.com.br