Frei Marcos Sassatelli
Segundo o
Evangelho de Lucas, para atender ao recenseamento que o imperador César
Augusto mandou fazer no império, "todos iam registrar-se, cada um na sua
cidade natal. José era da família e descendência de Davi. Subiu da
cidade de Nazaré, na Galileia, até à cidade de Davi, chamada Belém, na
Judeia, para registrar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida.
Enquanto estavam em Belém, se completaram os dias para o parto, e Maria
deu à luz o seu filho primogênito. Ela o enfaixou, e o colocou na
manjedoura, pois não havia lugar para eles dentro de casa" (Lc 2, 3-7).
Meditando sobre
o relato do nascimento de Jesus, fico pensando: Se “não havia lugar
para eles dentro de casa”, José e Maria, grávida de Jesus, devem ter
perambulado, dias e noites, nas ruas e praças de Belém; devem ter
dormido diversas vezes debaixo das marquises dessas mesmas ruas e
praças; e devem ter batido em portas de muitas casas, inclusive dos
parentes de José, para pedir ajuda, mas - por serem pobres - as portas
sempre se fechavam na frente deles. Finalmente, quando “se completaram
os dias para o parto”, José e Maria - talvez por pena de alguma pessoa
bondosa - encontraram acolhida e abrigo num estábulo e Maria deu à luz
numa manjedoura.
Jesus se
solidarizou e se identificou de tal forma com “os pequeninos” (todos
aqueles que na sociedade não tem voz e não tem vez, são excluídos,
rejeitados e descartados) que, ainda antes de nascer, no seio de sua mãe
Maria, se tornou “morador de rua” em Belém.
E hoje? Jesus
continua sendo “morador de rua” em muitas cidades do Brasil, da América
Latina e do mundo, na pessoa de irmãos e irmãs nossos. Cada morador de
rua é Jesus ameaçado de morte. “Eu garanto a vocês: todas as vezes que
vocês fizeram (ou não fizeram) isto a um destes meus irmãos mais
pequeninos, foi a mim mesmo que o fizeram (ou não o fizeram)” (Mt 25, 40
e 45).
Cito o caso de
Goiânia destes últimos tempos, que - pelo alto número de assassinatos -
causou repercussão nacional. Uma Nota Pública, assinada por 38
entidades, afirma que, na cidade de Goiânia, “a sociedade acompanha
estarrecida os contínuos assassinatos de moradores de rua”. “Nos últimos
meses deste ano já foram doze mortes: em outubro, três; em novembro,
seis; e em dezembro, até o momento, três. Nos casos mais recentes, em 10
de dezembro, que por sinal era o Dia Internacional dos Direitos
Humanos, foi assassinado a facadas o morador de rua ‘Fernando’, na Vila
Irani. Na madrugada do dia 11, foi assassinado com dois tiros ‘Tiago’,
no Setor Central. E na madrugada do dia 12, foi assassinado a tiros o
morador de rua ‘Michel’” (Nota Pública sobre os Assassinatos de
Moradores de Rua, Goiânia, 13 de dezembro de 2012). ´
Segundo as
últimas informações, “no período de dois meses, 14 moradores de rua
foram assassinados na capital de Goiás, Goiânia. Ontem, 17, duas pessoas
foram mortas” (http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/?c=27680&t=Numero+de+moradores... - 18/12/12).
Darci Accorsi,
secretário da Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMAS), afirma
“que todas as mortes são relacionadas com o tráfico de drogas e que
policiais militares estão diretamente envolvidos nos crimes” (http://www.portal730.com.br/cidades/secretario-de-assistencia-social-apo... -17/12/12).
De modo
enfático, a Nota Pública citada declara: “Repudiamos e condenamos
veementemente esses assassinatos, denunciando-os como gravíssimas
violações aos Direitos Humanos. Nada justifica crimes tão bárbaros. A
vida deve estar em primeiro lugar!”.
Enfim, a Nota
Pública conclui com dois pedidos. O primeiro: “Pedimos ao secretário da
Secretaria Municipal de Assistência Social de Goiânia (SEMAS), Darci
Accorsi, e ao prefeito Paulo Garcia que, em caráter de urgência
urgentíssima, implementem políticas públicas que visem, em primeiro
lugar, a acolhida e a proteção aos moradores de rua e, em segundo lugar,
ajudem esses moradores a se conscientizarem sobre o sentido (o valor)
da vida humana, aumentando o reconhecimento de suas potencialidades e de
sua autoestima”
O segundo:
“Pedimos, também, ao secretário da Secretaria de Segurança Pública e
Justiça do Estado de Goiás (SSPJ-GO), Joaquim Cláudio Figueiredo
Mesquita e ao governador Marconi Perillo que, com responsabilidade e
agilidade, tomem as providências cabíveis para identificar e processar
os responsáveis - mandantes e executores - desses assassinatos, que
gritam por justiça diante de Deus”.
Trata-se de
violência estrutural (institucionalizada) que todos e todas devemos
combater. No Natal, somos impelidos/as a renascer para viver uma vida
nova, uma vida de irmãos e irmãs, uma vida de justiça e de compromisso
com os Direitos Humanos. Que o Menino Jesus nos traga este presente!
Publicado em Brasil de Fato
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