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Cardeal se orgulha de amizade com um dos comandantes da Junta Militar que em sete anos deixou 30 mil mortos, e foi chamado a depor em vários processos
Anunciado hoje (13) como novo papa em uma votação tida como
surpreendente, o cardeal argentino Jorge Mario Bergoglio é investigado
dentro de seu país pela colaboração com a ditadura. Nos dois processos
mais famosos, responde pela ajuda que teria dado ao sequestro e à
tortura de dois jesuítas e à apropriação de bebês, prática comum do
último regime militar (1976-83).
A participação de Bergoglio no governo responsável pela morte de 30 mil
pessoas é antiga e famosa, mas os sinais mais claros surgiram ao longo
da última década, quando, após a derrubada de leis que protegiam os
repressores do passado, foi possível dar início a julgamentos. O próprio
cardeal se orgulhava das boas relações com o comandante da Marinha
Emilio Massera, integrante da primeira Junta Militar e responsável, em
1955, por derrubar Juan Perón durante a autodenominada Revolução
Gloriosa – um golpe de Estado, na realidade.
Foi na Marinha que se formou o principal campo de concentração do regime
iniciado em 1976. A Escola de Mecânica (Esma, na sigla em castelhano)
recebeu 5 mil prisioneiros, e menos de 200 deles saíram com vida. A
causa Esma é uma das principais iniciadas nos últimos anos, e tem
resultado em desdobramentos que alcançaram Bergoglio.
Ciente disso, e ansioso pela possibilidade de assumir o papado em caso
de renúncia de Joseph Ratzigner, Bento XVI, Bergoglio encomendou em 2010
uma operação de "limpeza" de seu nome. Segundo reportagem do jornal
argentino Página12, o livro El Jesuíta foi escrito com a intenção de
desfazer as más impressões criadas em torno do religioso pelo período em
que comandou a Companhia de Jesus, entre 1973 e 1979.
Em 2010, juízes do Tribunal Oral Federal número 5 foram até a sede do
arcebispado de Buenos Aires tomar o depoimento do cardeal, acusado de
trabalhar pelo sequestro e pela tortura de dois jesuítas em 1976.
Naquele momento, Bergoglio comandava a Companhia de Jesus em San Miguel,
e uma série de testemunhos o conectam ao crime.
Francisco Jalics e Orlando Yorio, as próprias vítimas do sequestro,
acusam Bergoglio de havê-los denunciado, em uma operação policial na
qual desapareceram Mónica Candelaria Mignone,María Marta Vázquez Ocampo e
Martha Ocampo de Vázquez. Em 2011, o jornalista Horacio Verbistky
descobriu um documento do Ministério das Relações Exteriores e Culto da
Argentina que corrobora a suspeita. Naquele momento, Jalics, húngaro,
havia feito um pedido de renovação de seu passaporte. O informe da
chancelaria aponta que Bergoglio apontou que havia “suspeitas de contato
com guerrilheiros” e “conflitos de obediência”. A solicitação do
jesuíta foi negada.
Em 2010, o médico Lorenzo Riquelme, então com 58 anos, declarou que o
grupo que o sequestrou e torturou saiu da sede da Companhia de Jesus.
Militante da Juventude Peronista e do movimento cristão, Riquelme deu a
declaração com base no que foi dito a sua mulher, também raptada. Ela
trabalhava no Observatório de Física Cósmica de San Miguel, que passou
de um reduto peronista a um lugar de atuação de homens infiltrados da
Marinha e sob controle de Bergoglio.
Mom Debussy, um jesuíta que tinha a confiança de Bergoglio, afirmou que
algumas vezes o cardeal lhe contou sobre os projetos de Massera, sempre
demonstrando simpatia pelo regime, e que pretendia vender à Marinha o
Observatório de Física. Debussy disse ainda que os trabalhadores do
Observatório eram demitidos pelo religioso depois de voltar das sessões
de tortura.
Outro documento oficial, datado de 1976, narra o que o líder religioso
defendeu a comandantes militares. Advogou esclarecer a posição da Igreja
Católica, de suporte ao regime, afirmando que “de nenhuma maneira
pretendemos formular uma posição de crítica ao governo”, dado que um
fracasso “levaria, com muita probabilidade, ao marxismo”.
Em 2011, veio à tona a possível participação de Bergoglio em um caso de
sequestro de bebês, uma prática adotada pelo regime, que executou várias
mulheres grávidas ou com filhos pequenos. O Tribunal Oral Federal
número 6 convocou o cardeal a depor no processo de Estela de la Cuadra,
uma das fundadoras das Avós da Praça de Maio. Segundo Estela, o agora
papa tem relevantes informações sobre o desaparecimento de sua sobrinha,
Ana, roubada dos braços da mãe em uma delegacia de La Plata, cidade
vizinha a Buenos Aires.
No mesmo ano, a Justiça francesa determinou que o Judiciário argentino
tomasse o depoimento de Bergoglio pela suspeita de participação no
desaparecimento de um padre francês que morou na Companhia de Jesus. O
testemunho de uma monja em 1984 já indicava a relação do então chefe da
congregação com o sequestro que resultou nas mortes de Gabriel
Longueville e do sacerdote Carlos de Dios Murias.
Leia mais em: Blog Sujo : Novo papa é associado a sequestros de jesuítas e bebê durante ditadura argentina
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